Depois de bancar o espertão, corri para o fliperama e, sei lá, acho que todos que fazem isso, que tentam se dar bem de alguma forma, se sentem inatingíveis e eu senti que nada ia acontecer, claro que nem imaginei as consequências: quem é que imagina na hora de jogar um fliperama? Pois bem, cheguei lá no fliperama e praticamente as máquinas viravam para mim e diziam: “ME JOGUE”… Era hipnotizante! Claro, já cheguei no balcão que ficava no fundo da loja e coloquei a nota pela entrada, era um daqueles balcões fechados, e falei: Quantas fichas dá?
E como havia falado né… se com 100 cruzeiros rolavam 5 fichas, com 1000 passou de 50, pois a tiazinha até falou: “Você quer tudo em ficha mesmo?” e claro que respondi: “SIM EU QUERO SIM” e pensando hoje, soa engraçado esse desespero. Meus bolsos ficaram cheios, fazendo aquele barulho que alguns moleques que ali estavam reconheciam e perguntavam: “Você tem ficha ai?” e como um generoso jogador sai dando ficha para quem pediu. E depois já corri para meu jogo preferido da época NEW RALLY X e passei a jogar. Claro que alguns dos moleques já se tornaram meus amigos na mesma hora. O que uma ficha não fazia dentro de um fliperama?
Roubar para jogar isso? Sim…
Claro, me perdi no tempo, parecia que eu estava a dias por lá, jogando aqueles jogos incríveis, recebendo atenção de outras crianças e – óbvio – nem lembrando do que tinha feito, mas depois de um tempo eu olhei para a porta e vi ali meu tio e meu pai olhando para mim. Larguei o jogo e fui lá já pensando no pior, pois o olhar deles indicavam um desgosto muito grande. Meu pai não falou muito, só perguntou: “Aonde está o dinheiro?” e eu falei que tinha comprado tudo em ficha… Ele virou e disse: ”Se vira, pega as fichas e troca pelo dinheiro”. Nossa, que vergonha que senti, cheguei a pedir algumas fichas de volta, já que dei mais de uma para algumas pessoas e apenas poucos devolveram. Com todas elas na mão, fui até o balcão e – empurrando todas elas – já fui pedindo: “Tia, troca essas fichas aqui?”. A mulher surpresa perguntou por quê e, meio cabisbaixo, olhei para a porta e lá ela pôde ver meu pai e meu tio na porta com aquela cara que a fez pegar as fichas e devolver em torno de 750 cruzeiros.
Sim, não deu para jogar tanto quanto eu gostaria e na minha tentativa de fazer amigos, mesmo que não me lembre a real intenção da época, acredito que fiz aquilo para chamar atenção e ser aceito e quem sabe relembrado depois. De qualquer forma, senti um constrangimento indescritível, acho que as palavras que uso agora não seriam suficientes para explicar como me senti. A vergonha de todos notarem que aquilo que fiz foi baseado em algo errado, que eu nem tentei me justificar e principalmente o olhar do meu pai e do meu tio, aquele que mostra o quanto estão decepcionados com vocês. Bem, um dos meninos ali se despediu de mim: lembre-se dele.
E quem não fez amizades no Fliperama?
Depois, andei lentamente até em casa, meu pai não disse uma palavra e meu tio foi dando aquele velho e bom sermão sobre como é errado pegar dinheiro. E isso agora eu não lembrava, portanto fui à fonte, perguntei ao meu velho pai se ele tinha me batido, eu sinceramente, não lembrava disso, mas ele me deu o positivo para tal. E ele lembrava que não disse nada e que foram três cintadas enquanto eu estava encurralado entre os beliches no quarto. Mas não tem o que reclamar disso, eu mereci mesmo e já digo… CRIANÇAS, NUNCA PEGUEM DINHEIRO DO PAI DE VOCÊS PARA JOGAR FLIPERAMA. Se bem que hoje em dia esse conselho não é tão válido, pois os fliperamas a muito deixaram de existir.
Lembro que chegamos numa sexta à noite, então isso era domingo e meu pai teria que subir no máximo terça, então fiquei meio que sob o olhar vigilante dos dois adultos presentes, apenas saindo para almoçar e jantar e nem sair do condomínio eu pude sair. Não me lembro de mais conversas, pois ainda sentia aquela vergonha e, claro, quando finalmente voltamos para São Paulo, meu pai contou o ocorrido para minha mãe, que primeiro me bateu com uma sandália e depois me abraçou. Minha mãe sempre fazia isso comigo, jeito estranho de me dar um corretivo, mas era dela que eu sentia medo de verdade.
Medo mesmo era da minha mãe
Agora eu vou ficando por aqui. Até a próxima ida até a Praia Grande, pois a partir de agora por um longo tempo esse foi o lugar pelo qual os fliperamas e os jogos entraram na minha vida.